Nossa interface com a vida selvagem também é afetada por atividades como o desmatamento e a expansão da agricultura em áreas anteriormente não tocadas. Tais atividades alteram a composição, abundância e comportamento dos animais e aumentam as taxas de contato entre animais e humanos. Vale lembrar que toda espécie animal é um potencial “reservatório viral” de doenças até então desconhecidas.
Desmatamento (também chamado de desflorestamento ou desflorestação) é o processo de desaparecimento completo e permanente de florestas, causado quase sempre por atividades humanas. As principais causas do desmatamento são o uso da madeira como combustível e como material de construção e a abertura de áreas para agricultura, pastoreio e habitação (Fonte).
A desflorestação quase sempre acompanhou o crescimento da população humana. Hoje somos quase 8 bilhões de pessoas habitando o planeta, aumentando a pressão sob mata até então virgem. Ao desmatarmos causamos diversos danos a natureza. Comecemos com o mais diretamente relacionado ao surgimento de novas pandemias
Índice
Desflorestamento leva a um maior contato com animais selvagens — e suas doenças
De acordo com o fórum econômico mundial, cerca de 31% das novas doenças estão relacionadas ao desflorestamento (Fonte).
Ao desmatar, levamos à perda do habitat natural de certas espécies. Por exemplo, uma nova expansão agrícola poderá se aproximar perigosamente de uma caverna habitada por morcegos que carregam vírus até então desconhecidos, origem provável da SARS (SARS-CoV-1) em 2003. Vice-versa, morcegos que antes se abrigavam em árvores que foram derrubadas poderão buscar refugio casas e galpões para fazerem sua moradia.
Com a migração de espécies para novos locais aumentam também os riscos de transmissão zoonótica de novas doenças, ou seja, de doenças que migrem de uma espécie para outra, inclusive para o homem, assim como para os animais de estimação e rebanhos. O caminho é de duas vias, podendo os humanos transmitirem doenças para a vida selvagem, colocando mais uma pressão sob espécies já ameaçadas.
Vale a pena lembrar que as repercussões deste contato vida selvagem-homem não são eventos pontuais nem são encontrados apenas em terras distantes: raiva, peste, salmonelose(salmonela), hantavírus são apenas alguns exemplos de doenças que tiveram essa origem.
Além dos riscos de surgimento de novas doenças, o desflorestamento trás uma série de outros problemas.
Perda da biodiversidade
Mesmo de um ponto de vista estritamente econômico a perda de biodiversidade representa grande fonte de riscos e custos: muitos materiais industriais derivam diretamente de fontes biológicas, tal como fibras, corantes, borracha e óleo. Mais importante que isso é o papel que a biodiversidade desempenha na regulação da química de nossa atmosfera e do suprimento de água. A biodiversidade está diretamente envolvida na purificação da água, na reciclagem de nutrientes e no fornecimento de solos férteis. Como resultado, a perda de biodiversidade é um fator de risco significativo no desenvolvimento dos negócios e uma ameaça à sustentabilidade econômica a longo prazo.
A biodiversidade também fornece suporte crítico para a descoberta de medicamentos e a disponibilidade de recursos medicinais. Uma proporção significativa de medicamentos é derivada, direta ou indiretamente, de fontes biológicas: pelo menos 50% dos compostos farmacêuticos no mercado dos EUA são derivados de plantas, animais e microorganismos, enquanto cerca de 80% da população mundial depende de medicamentos da natureza. (Fonte)
Contribui enormemente para o aquecimento global
Cálculos recentes conseguiram estimar que o desflorestamento contribui com 12% de todas as causas antropogênicas (ou seja, de responsabilidade humana) de aquecimento global, com uma variação mínima de 6% e máxima de 17%. (Fonte).
O aquecimento global representa por si só um risco grave para a humanidade e por isso falaremos mais sobre ele na proposta sobre “nos precavermos contra outros riscos catastróficos”.
Contudo, queremos destacar aqui que a combinação de desmatamento + aquecimento global contribui ainda mais para a alteração dos ecossistemas e a consequente migração de espécies para novos locais. Tal migração, como vimos anteriormente, é mais um fator de risco para a transmissão de novas doenças de uma espécie para outra. Ou seja, se o desflorestamento já contribui por si só para o possível surgimento de uma nova próxima pandemia, o “combo” desflorestamento+aquecimento global torna esse risco ainda maior.
Este artigo faz parte da série: “Coronavírus: o que fazer para nunca mais acontecer”.
Autor: Fernando Moreno