Drogas psicodélicas estão tendo seus 15 minutos de fama. Estamos descobrindo que elas tem um grande potencial como tratamento para uma variedade de distúrbios mentais, incluindo transtorno de estresse pós-traumático e depressão. Elas também têm atraído interesse por serem uma porta para experiências significativas que, segundo seus defensores, deveriam ser acessíveis a todos.
Filantropos estão tomando nota. Mais doadores — apesar de ainda longe do suficiente — estão se movimentando para apoiar tanto a pesquisa dos benefícios medicinais com a defesa política com argumentos a favor destas drogas.
Este é o por quê dos psicodélicos apresentarem uma oportunidade inexplorada para a filantropia.
As últimas notícias sobre os psicodélicos como terapia: Mês passado, em Londres, o Imperial College abriu o primeiro centro formal de pesquisa sobre psicodélicos, o qual buscará desenvolver terapias com psilocibina de modo a torná-lo um tratamento licenciado para depressão e investigar seu potencial para tratar outros distúrbios. Dr. Robin Carhart-Harris, um proeminente pesquisador que lidera esta iniciativa, diz: “Este novo Centro representa um momento marcante para o estudo de psicodélicos; simbólico de seu reconhecimento, agora mais prevalente.” Cinco doadores fundamentais, incluindo o escritor best-seller, podcaster e investidor Tim Ferriss, doaram um total de 3 milhões de libras (3,9 milhões de dólares) para a fundação deste centro.
“Esta é minha prioridade número um”, Ferriss afirmou recentemente. Ferriss tornou-se o principal pregador da pesquisa psicodélica, doando tanto seu próprio dinheiro quanto levantando fundos de outros apoiadores. “Tenho visto vidas serem salvas por esses componentes, não uma vez, não duas, mas dezenas de vezes,” ele diz.
Dois meses atrás, a FDA (órgão americano que regula a produção de alimentos e remédios) aprovou o uso da escetamina, um derivado da quetamina — uma droga recreativa com efeitos psicodélicos — como tratamento para depressão. Diferente das drogas existentes para este tratamento, a escetamina parece funcionar induzindo um estado mental alterado que leva a mudanças na percepção e comportamento.
“É um divisor de águas para a psiquiatria”, diz Dr. Jeffrey Borenstein, presidente e CEO da Brain & Behavior Research Foundation, que forneceu recursos para o estudo da quetamina como antidepressivo de ação rápida.
As últimas notícias sobre psicodélicos para todos: Este mês, Denver tornou-se a primeira cidade nos EUA a efetivamente descriminalizar a psilocibina, que é o princípio ativo dos chamados “cogumelos mágicos” que tem sido utilizado por séculos em culturas antigas. (O Partido Verde e o Partido Libertário dos EUA apoiaram a descriminalização). Há também uma movimentação pela descriminalização da psilocibina em Oakland, na Califórnia, e em Oregon.
Próximo mês nos trará a abertura do Atman Retreat, um centro de retiro que promete oferecer “experiências legais e seguras com psilocibina” em um terreno à beira-mar na Jamaica. Aaron Nesmith-Beck, fundador do Atman Retreat, é ativo na comunidade do Altruísmo Eficaz, onde tem sido debatido se a pesquisa psicodélica e sua defesa deve se tornar uma causa apoiada oficialmente pelo movimento.
Estes empolgantes desenvolvimentos, contudo, assim como tudo relacionado a drogas psicodélicas, precisam de alguma cautela. Os benefícios medicinais da terapia assistida por psilocibina ou MDMA ainda precisam ser replicadas em uma grande escala. O uso recreativo desmedido de psilocibina pode ser imprudente, principalmente porque essas drogas permanecem ilegais nos EUA.
O escritor Michael Pollan, cujo livro best-seller sobre a ciência dos psicodélicos, “How to Change Your Mind”, desempenhou um papel importante no despertar do interesse por essas drogas. Após a votação pela liberação no estado do Colora ele foi até as páginas do New York Times para recomendar cautela a todos.
“Ainda que os defensores da legalização da psilocibina queiram seguir a tendência política que rapidamente mudou o status da Cannabis nos últimos anos, eles precisam ter em mente que a psilocibina é uma droga muito diferente e que não é para todos”, escreveu Pollan.
Meu interesse nessas drogas, hum…“germinaram” após ler o livro de Pollan. Desde então, conversei com cientistas, defensores e financiadores enquanto documentava, lá e cá, histórias sobre filantropia e psicodélicos para a edição de maio do The Chronicle of Philantropy (veja aqui e aqui). As evidências vêm crescendo de que o uso de psilocibina e MDMA, quando administrado por profissionais e acompanhado de terapia, pode ajudar a aliviar o sofrimento de uma gama inesperada de perturbações, incluindo transtorno de estresse pós-traumático, depressão, ansiedade, anorexia, vício em cigarro, álcool e opioides.
Surpreendentemente, pacientes em testes clínicos relatam que uma única experiência ou duas com a droga pode ter efeitos duradouros em suas atitudes e comportamentos. Estas drogas podem, literalmente, ajudar a mudar sua mente, ao que parece.
Em um artigo recente na revista Neuropharmacology chamada “Psicodélicos: Onde Estamos Agora, Como Chegamos Aqui e o Que Devemos Fazer” (tradução livre), Sean Belouin e Jack Henningfield escrevem: “Tais benefícios duradouros auxiliados por uma a duas doses de um medicamento, particularmente em pacientes gravemente enfermos e debilitados, podem emergir como uma das descobertas mais importantes no desenvolvimento da psiquiatria e medicação em décadas”. A chamada renascença da ciência dos psicodélicos está progredindo rapidamente, com pesquisas sendo conduzidas na Universidade Johns Hopkins, Universidade de Nova Iorque, Yale, Universidade da Califórnia em São Francisco e também na Imperial College.
Um incomum grupo de financiadores
Filantropia é essencial para esta pesquisa. O estigma que envolve as drogas psicodélicas permanece tão forte que há pouco incentivo do governo para seus estudos. Com um orçamento de 1,8 Bilhões de Dólares, o Instituto Nacional de Saúde Mental é o maior investidor da pesquisa de transtornos mentais no mundo, mas quase nada desse dinheiro vai para o estudo de psicodélicos.
Com algumas exceções, empresas farmacêuticas também não estão interessadas.
“Psicodélicos não são protegidos por patente, não podem ser monopolizados e competem com outras medicações psiquiátricas que as pessoas usam no dia-a-dia”, explica Rick Doblin, fundador e diretor da Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos, ou MAPS, um grupo de defesa e estudo que é a principal instituição sem fins lucrativos nesta área.
Dois anos atrás, a própria pesquisa da MAPS sobre o uso de MDMA, também conhecido como ecstasy, para o tratamento de transtorno de estresse pós-traumático recebeu a designação de “terapia inovadora” pelo FDA. O protocolo da MAPS, que combina terapia com três doses de MDMA, está atualmente na fase final dos testes clínicos, e pode receber aprovação do FDA até 2021.
A MAPS foi totalmente sustentada por doações de indivíduos e fundações familiares. Esses doadores incluem ex-hippies, ativistas liberais, seguidores da Nova Era, políticos conservadores, empresários de tecnologia e um milionário anônimo do Bitcoin conhecido como Pine. Famílias americanas de destaque, incluindo os Rockefellers e os Hyatts, financiaram pesquisas.
Cari Tuna e Dustin Moskovitz — o bilionário co-fundador do Facebook — apoiaram três instituições sem fins lucrativos focadas na pesquisa de psicodélicos. Good Ventures, sua fundação familiar, fez duas doações de 100 mil dólares para o Instituto Heffter e uma de 500 mil dólares para o Instituto Usona para condução de testes do uso de psilocibina como tratamento para depressão. Good Ventures também fez duas doações de 500 mil dólares para a MAPS para sua pesquisa sobre psicoterapia assistida por MDMA para o transtorno de estresse pós-traumático.
As ações filantrópicas de Tuna e Moskovitz são influenciadas pelo altruísmo eficaz, que incentiva as pessoas a usar a razão e evidências para fazer o maior bem possível. O Altruísmo Eficaz procura por causas que são importantes, tratáveis e neglicenciadas (para mais explicações, veja isto e isto), o que faz com que a pesquisa com psicodélicos se encaixe perfeitamente. O sofrimento por doenças mentais é generalizado. Há crescentes evidências de que psicodélicos podem ajudar e relativamente poucos fundos filantrópicos destinados para essa causa — menos de 100 milhões por ano, pela minha estimativa. Em comparação, a Sociedade Americana pelo Câncer gastou 838 milhões de dólares e a Associação Americana do Coração gastou 890 milhões de dólares em seus últimos anos fiscais.
“Se você olhar o montante de investimento que vai para pesquisa do cérebro comparado com outras doenças como câncer, é minúsculo”, afirma Dr. Borenstein do Brain & Behavior Research Foundation. Especialmente quando descobrimos cada vez mais sobre o funcionamento do cérebro através de escaneamentos e ressonâncias, a oportunidade de ajudar aqueles que sofrem de distúrbios mentais está crescendo.
Dito isto, há razões para o ceticismo quanto à terapia com psicodélicos, segundo o psiquiatra e blogueiro Scott Alexander. Ele escreve, entre outras coisas, que “entre 10% e 50% doa americanos já usaram psicodélicos. Se estas drogas fizessem algo tão extraordinário, já saberíamos algo sobre isso”. É importante não deixar que a exuberância que tem rodeado os psicodélicos fique na frente das evidências.
O poder transformativo dos psicodélicos
Neste meio tempo, o trabalho feito em defesa dos psicodélicos podem ter ainda mais potencial de mudar o mundo, dizem alguns. A defesa é motivada por uma simples, mas profunda convicção: de que todos devem ter a liberdade de escolher que substâncias colocar em seus corpos.
Para muitos, os benefícios de “expansão mental” dos psicodélicos pode pesar mais que os riscos: um estudo intrigante de 2006, liderado pelo Dr. Roland Griffiths na Johns Hopkins descobriu que a psilocibina pode, de forma eficaz, induzir “um tipo experiência mística, com significado pessoal e espiritual profundo e substancial”. Foi um estudo pequeno, com apenas 30 voluntários, mas dois terços deles relataram que a “viagem” com a droga esteve entre as cinco experiências mais significativas de suas vidas.
Ao fundar o Atman Retreat na Jamaica, Nesmith-Beck deixará a psilocibina legalmente acessível para aqueles que podem gastar quatro dias e aproximadamente 1.700 dólares, mais passagens, para ter uma experiência em grupo com doses personalizadas para as preferências dos usuários, preparação e integração com facilitadores treinados e comodidades como o acesso à praia e refeições vegetarianas. Seu primeiro retiro tem como objetivo atrair os membros doAltruísmo Eficaz e está quase lotado.
Em um fórum do Altruísmo Eficaz, Nesmith-Beck faz uma afirmação ousada:
“Acreditamos que o aumento do acesso a experiências psicodélicas de alta qualidade pode ser impactante para melhorar a saúde mental, aumentar a produtividade, e talvez até tornar as pessoas mais altruístas e promover o crescimento humano a longo prazo.”
Ouvi afirmações semelhantes ao escrever uma história para o The Chronicle. Vários entusiastas me disseram que as experiências psicodélicas conectam as pessoas à natureza, e há pelo menos uma fraca evidência de que as pessoas que experimentaram LSD, psilocibina e mescalina durante a vida se sentem mais próximas da natureza e se envolvem em comportamentos ecológicos, tal como a reciclagem. Obviamente, isso pode ser uma questão de correlação, não de causalidade.
Allan Badiner, escritor, editor e ativista ambiental, teve experiências com psicodélicos enquanto apoiava causas ambientais. Ele atuou no conselho da Rainforest Action Network por mais de 25 anos e agora ajuda a financiar pesquisas psicodélicas e sua defesa na Threshold Foundation.
A Threshold, uma fundação liberal, tem um círculo de financiamento chamado PREP (Psychedelic research education and policy) que é “fundamentado na visão de que os psicodélicos são ferramentas poderosas para a expansão da consciência e o foram para toda a história da humanidade”. Seu objetivo é “apoiar o uso inteligente de psicodélicos como medicamento, um poderoso complemento da terapia, uma ferramenta para o autodesenvolvimento e, como resultado, contribuir para uma sociedade mais compassiva, saudável e pacífica”. O PREP fez pequenas doações para grupos como a MAPS, o Instituto de Estudos Integrais da Califórnia e o Centro Internacional de Pesquisa e Serviço Etnobotânico.
Badiner me enviou estas palavras de Stanislav Grof, um psiquiatra nascido na República Tcheca que estuda psicodélicos e outros estados mentais alterados há mais de 60 anos:
“A profunda reverência pela vida e a consciência ecológica estão entre as conseqüências mais freqüentes da transformação psico-espiritual que acompanha o trabalho responsável com estados alterados de consciência… Estou convicto que um movimento na direção de uma percepção mais completa de nosso inconsciente aumentará amplamente nossas chances de sobrevivência planetária.”
Para os filantropos, pode haver um risco em tomar o lado da pesquisa e defesa dos psicodélicos — mas a vantagem potencial é enorme.
Tradução: Luna Praun
Escrito por Marc Gunther em 20 de maio e publicado originalmente em: https://medium.com/@marcgunther/philanthropy-psychedelics-and-effective-altruism-68bb439d7b9e