Como sair da pobreza? Diversas são as opções no cardápio de estímulo econômico contra a extrema pobreza: dar dinheiro diretamente aos mais pobres, investir na geração de empregos, oportunizar crédito social, fomentar o empreendedorismo, entre tantas outras. Mas afinal, qual delas de fato funciona?
Nota: O texto a seguir pressupõe algum conhecimento do trabalho da GiveWell. Trata-se de um organização intimamente ligada ao movimento do Altruísmo Eficaz e que se propõe a mensurar quais as intervenções sociais mais eficazes e quais as ONGs mais eficazes em sua implementação.
Recomendamos que tenha um primeiro contato com tais avaliações para entender melhor o restante do artigo. Neste link você pode ter um primeiro contato em português com o que faz a GiveWell e avaliações resumidas das organizações. Ou você pode acessar o site deles, em inglês.
Índice
4 maneiras de tirar alguém da extrema pobreza
1. Dinheiro diretamente para os mais pobres como a régua mínima
Tenhamos em mente que a GiveWell considera a transferência direta de renda, tal como feita pela GiveDirectly, a “régua” mínima de intervenções eficazes, ao menos no que diz respeito as causas humanitárias (saúde/redução de pobreza).
O raciocínio básico por trás disso é: se sua organização não consegue ser mais eficiente do que simplesmente entregar dinheiro diretamente as pessoas mais pobres, não há motivo para financiá-la.
Por conta disso, dentre as organizações recomendadas pela GiveWell consta a própria Give Directly e outras organizações com custo benefício estimado como sendo superior a Give Directly.
Vale observar que isso se aplica as “Top Charities”. As organizações “Stand-out” tem custo-eficácia, ao menos nas estimativas pessimistas, piores que a Give Directly (as estimativas otimistas podem superar a custo-eficácia calculada para a Give Directly).
2.Dar dinheiro diretamente aos mais pobres ou dar um emprego? Talvez nenhum dos dois funcione
A newsletter do site Altruísmo Eficaz de julho de 2019 trouxe insights importantes sobre o tema, no conteúdo eles mencionam o fato de economistas já terem proposto muitas estratégias diferentes para reduzir a pobreza no mundo em desenvolvimento, o que inclui transferências de renda (dando às pessoas o dinheiro que elas podem usar para adquirir habilidades ou construir um negócio) e emprego direto (dando empregos às pessoas).
A publicação cita um estudo que comparou a transferência de renda com o emprego direto, oferecendo a desempregados etíopes uma transferência de renda (cash-transfer) ou uma posição na agricultura ou na manufatura.
O resultado: embora as transferências de renda inicialmente tenham impulsionado as horas de trabalho e os ganhos semanais, os benefícios de ambos os programas diminuíram com o tempo. Depois de cinco anos, nenhum dos grupos obteve melhores resultados do que as pessoas que não receberam ajuda. Os autores sugerem que a redução da pobreza pode exigir assistência sustentada em vez de uma única intervenção.
>> Leia mais: Fonte e Link para o estudo completo.
3.Uma abordagem um pouco mais complexa para um problema igualmente complexo
Trata-se de mais uma evidência de que, talvez, na luta contra a pobreza, intervenções continuadas (em oposição a uma intervenção única e pontual) e que tentem “atacar” o problema por múltiplos caminhos (o que poderíamos talvez chamar de “ações multifacetadas” e que também são conhecidas lá fora como “ações de graduação”), podem ser mais eficazes que a transferência direta de renda.
Essa polêmica não é nova. Em 11 de março de 2014, Kevin Starr e Laura Hattendorf, da Fundação Mulago, escreveram um longo artigo na Stanford Social Innovation Review, cético quanto aos resultados das ações de transferência de dinheiro feita pela GiveDirectly até agora.
Entitulado “GiveDirectly? Não tão rápido. Estamos confundindo uma importante experiência com uma solução comprovada.” o artigo diz que a evidência de eficácia acumulada até o momento estava abaixo do esperado. Eles compararam a GiveDirectly com outras instituições de caridade que acreditam ter tido mais sucesso: One Acre Fund, VisionSpring, KickStart International e Proximity Designs.
Holden Karnofsky, da GiveWell, escreveu uma longa resposta, argumentando que o impacto da GiveDirectly estaria mais rigorosamente estabelecido, e que Starr e Hattendorf estavam usando métricas problemáticas para julgar o impacto. A GiveDirectly publicou de forma independente uma resposta em seu blog.
Mais recentemente, em outubro de 2018, um artigo da Vox já levantava novamente essa questão (Dar dinheiro é uma ótima maneira de combater a pobreza. Essa abordagem pode ser ainda melhor).
4.E o crédito social (microcrédito/microfinanças)?
De todo modo, todas as abordagens acima debatidas são quase certamente superiores ao “crédito social” também chamado de “microfinanças”, abordagem que ficou muito popular ao emprestar dinheiro a população “desbancarizada” mas cujos resultados na redução da pobreza dificilmente foram observados nos diversos estudos feitos.
A GiveWell define microfinanças como “a prática de fornecer empréstimos e outros serviços financeiros (como contas de poupança ou seguros) para indivíduos pobres (em grande parte) no mundo em desenvolvimento”, também supõe que “o microfinanciamento, como um todo, fez muito bem, mas também provavelmente causou algum dano” e conclui que essa intervenção “não está entre as melhores opções para os doadores que buscam realizar o máximo possível”.
Uma última observação: Das organizações citadas nesse artigo a GiveWell recomenda apenas a ONG Give Directly. A The Life You Can Save recomenda igualmente a Give Directly e também a Village Enterprise e a One Acre Fund.
Autor: Fernando Moreno