O desafio da semana é para a galera woke defensora das minorias e contra todo tipo de opressão e injustiça. Prepara a granola que lá vem textão!
Passo 1: Já parou para pensar que… Você luta por empregos dignos para os trabalhadores brasileiros, mas nunca gastou nem um minuto para ouvir os funcionários dos abatedouros? Dá um pause no Irmão do Jorel aí, leia essa matéria ou a investigação Moendo Gente ou veja “A Carne é Fraca”. Fecha o Foucault aí no sofá e gasta uns minutinhos nessa pesquisa?
E depois bora praticar nossa empatia? Se você pode ingerir 100% das proteínas direto das plantas, por que financiar e obrigar um ser humano a martelar diariamente dezenas de cabeças de animais inocentes? A passar o turno inteiro banhado de sangue cortando pescoços de porcos? É possível lutar por direitos humanos dando crédito a uma indústria tão desumana?
Passo 2: Já parou para pensar que… Você é contra trabalho escravo e infantil e protesta nas ruas contra a Nike e a Zara, e pesquisa o método de produção, boicota empresas, faz petições, compartilha reportagens da Vice sobre essas violências, mas nunca gastou 1 horinha da vida para entender como os ingredientes do x-bacon chegam no seu prato? Você acha que sabe como é, crescemos achando, mas temos medo de VER de verdade, né?
E aí, bora praticar nossa empatia? Pesquisa 15 minutos para assistir a história dos ingredientes desse seu pudim aí. Como a vaca fica grávida? Para onde vai o bezerro quando ele é afastado da mãe? Como as galinhas não se bicam nas gaiolas? Quantos anos elas vivem naquelas condições?
Passo 3: Já parou para pensar que… Você diz defender as pessoas com fome, mas sua carne e queijo concentram renda e tomam 80% das áreas agricultáveis do mundo?
E aí, bora praticar nossa empatia? Quantos brasileiros realmente comem carne e queijo todo dia como você? Sua carne demanda quase 100% da plantação de soja e milho no país para virar ração (sem falar em desmatar florestas para pasto). E se todo esse espaço fosse redirecionado para plantar arroz, feijão, couve, lentilha, grão de bico, batata, beterraba, espinafre, frutas e toda uma imensa diversidade de plantas?
Um teste para passar ao próximo passo: como você acha que temos bilhões de pessoas passando fome no mundo, mas um exército sem fome de 80 bilhões de animais forçadamente nascidos e forçadamente alimentados?
Um pit stop importante enquanto você limpa a barba de gordura: lembre-se sempre que você só come animais por prazer, comodidade e hábito cultural que foi forçado a assumir desde a infância. Você cresceu sendo ensinado que precisa de proteína animal, mas 100% delas estão disponíveis nas plantas. Pneu novo, pit stop finalizado, bora pra corrida.
Passo 4: Você leu bastante sobre a opressão e violência que as mulheres sofrem até hoje, né? Eu também. Então apoiamos a luta feminista. Você leu sobre a opressão e violência que os negros sofrem até hoje, né? Eu também. Então apoiamos a luta antirracista. Você leu sobre a violência que outras minorias sofrem e continuou pesquisando e nem parou nos humanos, porque seu coração é grande, você leu também sobre violência contra cães e gatos e aprovou leis especiais que os defendem!
Que mundo bonito estamos criando! Você também leu sobre baleias, botos e tartarugas. Você é contra o tráfico de animais silvestres. Você percebe que seu círculo moral não acaba nos humanos, já se expandiu aos outros animais. Mas… por que só para alguns privilegiados?
E aí, bora praticar empatia? Se toda proteína pode vir das plantas, por que discriminar grupos dentro do reino animal? Por que alguns são queridinhos para você, são sua uma paixão!, sua vida!, mas outros você enxerga por pedaços e nem quer ver vídeos de como são esquartejados? Por que uns merecem ficar num hotel nas suas férias e outros precisam vir em pedaços no seu brunch?
Você luta contra a discriminação no mundo dos humanos. Ótimo! Mas será que, no mundo dos animais não humanos, você também é woke? Será que, aos olhos de alguns animais, você não é visto como um supremacista de grupos privilegiados? Será que vacas e porcos não te veem como um supremacista de gatos e tartarugas? Membro da KKK dos cães e animais silvestres? Só eles merecem respeito, o resto pode ir para a fogueira?
Se a Zara pratica racismo e expulsa um cliente negro da loja, insinuando ser um ladrão, isso é um absurdo e você protesta com razão. Então por que você suporta e passa o cartão roxinho para a decapitação de um porco, mas não faria o mesmo para a decapitação de um gato? Dentro do mundo animal, você não está fazendo a mesma coisa que a Zara fez com seres humanos?
Passo 5: você já tentou justificar seu consumo de proteína animal citando populações indígenas? Dado que você não caça dentro do Pão de Açúcar e ainda pede hambúrguer no Ifood toda semana, a cultura indígena é a sua mesmo?
Você ama estudos decoloniais de corpos, defende liberdades de mentes, reavaliação de conceitos sobre territórios, mas… já tentou aplicar a como você trata o corpo de um polvo? Um pato? Um boi?
Você defende a liberdade de cada um em suas escolhas pessoais, desde que não firam a liberdade alheia. Mas o que é uma escolha pessoal que discrimina a liberdade de alguns, condenando outros à passar a vida em galpões superlotados?
Você é contra a propriedade de corpos, mas só de humanos e de alguns grupos animais privilegiados. Você é contra a zoofilia do “pessoal do agro”, cada caso horrível de “iniciação sexual nas fazendas”, né? Mas por que você paga para a indústria da carne masturbar bois? Ou como você acha que a vaca é engravidada para nascer seu camembert?
Por que você paga para os órgãos sexuais de porcas serem invadidos ano após ano até terem seus úteros esgotados e improdutivos? Ou como acha que nasce seu seu bacon? Acha que a reprodução é só quando os animaizinhos das fazendas querem “namorar”?
Você prega o amor e respeito para humanos, cães, gatos e tartarugas. Para porcas e vacas e galinhas, você prega o quê? Não existe Tinder para as vítimas encarceradas nas fazendas industriais.
Um segundo pit stop para reabastecer enquanto você acorda do susto com tanta pergunta. Lembre-se novamente: você só come animais por prazer, comodidade e hábito cultural que foi forçado a aprender desde criança. Não foi sua culpa, você não teve oportunidade de fazer diferente, cresceu sendo ensinado que precisa ingerir animais, você viu que isso faz parte do ciclo da vida no filme do Rei Leão. Eu também. Segue o jogo.
Passo 6: Se você é contra acorrentar um cão, por que não dá o mesmo privilégio às galinhas? Elas têm asas e querem ciscar livres, mas 95% delas vivem em gaiolas no Brasil. Se você é contra armas, por que aceita que elas sejam utilizadas contra bezerros recém nascidos?
Se você defende todos os tipos de família, até adota 2 gatinhos irmãos pra não separá-los e terem companhia, por que separa os bezerros das mães na indústria do leite? Por que separa famílias de porcos e frangos como se fossem coisas? Por que financia 80 milhões de pintinhos triturados vivos logo que nascem e são roubados das mães? Aliás, por que objetifica essas vidas nas prateleiras dos mercados?
Passo 7, o final: Você passou anos pedindo empatia aos opressores, para eles entenderem o lugar de fala e o que os oprimidos tinham para dizer, você expandiu para os animais e até a natureza, ouve o pedido de socorro de cães e da Floresta Amazônica, mas não seria importante gastar um minuto para ouvir outros oprimidos? O que um porco enclausurado a vida inteira em celas superlotadas tem a dizer? E as vacas? Busque ouvir o choro delas ao serem separadas dos bezerros para que eles não roubem seu iogurte grego. Gaste dois minutos em uma cena dessas. Ouça os lamentos desesperados. Seu prazer e seus hábitos culturais te dão o direito de calar essas falas?
Call to action: Respire. Largue o cigarro de pendrive um minuto. Ligue seu app de meditação. Desacelere os batimentos. Foi muita reflexão que pedimos aqui. Você não tem culpa de nascer em um mundo que naturaliza essas violências. Mas você tem a possibilidade de mudar.
Seu corpo está acostumado a achar que precisa de proteínas animais. Sua dopamina está conectada com o quindim e o chocolate ao leite. Seu círculo cultural vive ainda sem perceber os bastidores da picanha e do pudim. Todos são vítimas dessa inércia cultural e das mensagens nas embalagens, fazendas cheias de animais felizes. Você ama os animais. Você é woke para muitas injustiças e violências do mundo, já quer acabar com tanta opressão. Reflita se quer continuar nesse crowdfunding de crueldades.
A boa notícia é que você pode começar a mudança já no próximo delivery. Opções plant based não faltam. Será um processo de transição. Seu corpo, sua mente e seu círculo de amigos vão se adaptar. A direção é mais importante que a velocidade.
Agora que você já tem a informação, já é woke… Que tal acordar mais um pouquinho?
Leandro Franz é economista, escritor e wannabe vegano. É autor dos livros “A Pequena Princesa” (Ed. Letramento), “No Útero de Paulo, o Embrião não Nascerá” (Ed. Penalux) e “120 dias de Corona” (Ed. Letramento) – este último lançado agora em 2022.
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