Se você deseja fazer o maior bem delimitações identitárias poderão enevoar suas intenções e até mesmo limitar a eficiência em causar o desejado impacto positivo no mundo.
Tudo aquilo que ao nos dividir, modula arbitrariamente (de acordo com proximidade identitária) a intensidade de nossa empatia, e nossa habilidade de objetivamente contrapor nossos pontos aos do outro, não pode ser bom.
A identidade, que é um conceito muitas vezes de significado amplo, geralmente se refere a localização do sujeito na sociedade, mas que pode se desenvolver numa relação de inclusão-exclusão. Possuir uma identidade pode significar possuir um conjunto coeso de elementos de distinção que nos aproximam de algumas pessoas, enquanto nos afastam de outras. Até este ponto ok, isso não necessariamente leva a algum problema, mas parece que a identidade, nesta relação de inclusão-exclusão, também pode levar a antagonismo a priori contra os “de fora”.
No livro de Liliana Mason, Uncivil Agreement: How Politics Became Our Identity (tradução: concordância “incívil”: Como a política se tornou nossa identidade) uma experiência é citada, onde jovens são separados em dois diferentes grupos, e sem entrar em contato com os indivíduos de outro grupo se desenvolve uma camaradagem interna em cada grupo, na mesma intensidade que desconfianças são levantadas em relação ao outro grupo. Quando os dois grupos finalmente interagem, esta interação é agressiva e beira a violência.
Alguns dias atrás compartilhamos um vídeo\artigo em que se defendia a tese de que na verdade somos todos compassivos “por natureza”, que o modo como a espécie humana evoluiu nos levou a ser compassivos e empáticos. O que não deixa de ser verdade, porém, nossa compaixão e empatia podem ser moduladas, podem ser limitadas aos “nossos”, nossa compaixão, nossa boa vontade ao interagir e trocar experiências/ideias pode ser limitada aos “de dentro”, ou pelo menos enfraquecida aos “de fora”.
Quando a lógica identitária “invade” a política, a filiação ideológica ou política começa a ser menos determinada por um modelo de interpretação da realidade política, e começa a ser mais determinada por “estilos de vida”. Aparentemente (pelo menos nos EUA de acordo com o artigo) os grupos polarizados demonstram estar se tornando cada vez mais homogêneos religiosamente, geograficamente e mesmo em relação a identidades sexuais.
Essa homogeneidade de uma identidade, em contraponto a uma homogeneidade oposta, pode fortalecer ideias, causas, objetivos que se tornam dogmatizados, influenciando até mesmo políticas públicas enviesadas e ineficientes. O problema aqui não é a existência de grupos divergentes em si, mas como essa divergência pode em alguns momentos se tornar cristalizada, e não fundamentada em debate. A divergência identitária é rígida, e em pouco lembra uma divergência que enriquece, destrói dogmas e leva ao progresso.
Se você deseja fazer o maior bem possível dentro de suas possibilidades (conforme a proposta do Altruísmo Eficaz), delimitações identitárias poderão enevoar suas intenções, restringir as causas que você pode ajudar, e até mesmo limitar a eficiência dos métodos disponíveis para um impacto positivo no mundo.
O exemplo citado neste post foi retirado deste artigo:
Caio Freire, membro da equipe do Altruísmo Eficaz Brasil.